A contratação de um alto executivo (CEO, CFO ou de qualquer diretor de uma corporação) é um momento bastante sensível para qualquer empresa. Além de oferecer um pacote de benefícios que se torne atrativo, é muito importante que sejam discutidas todas as cláusulas contratuais. Normalmente, como as empresas e o candidato estão “em fase de namoro”, acabam empurrando para um momento posterior a definição de cláusulas contratuais sejam elas de natureza trabalhista ou mercantilista.
Via de regra é o departamento jurídico ou a área de Recurso Humanos que vai assumir a missão de discutir as cláusulas que comporão o contrato de trabalho a ser celebrado entre as partes. A eles também é dada a responsabilidade de explicar as políticas de stock options (plano de participação nas ações da empresa) ou incentive share units (ISU) (verbas que buscam incentivar o empregado na busca de melhores resultados), entre outros. Justamente pelo fato de o empregado assumir o risco que acompanha o mercado acionário é que os especialistas defendem a tese de tais cláusulas não possuem natureza trabalhista, mas sim mercantil de vantagem.
Mesmo que controvertido, desde 2015 a Justiça do Trabalho vinha reconhecendo que “é lícita a cláusula que prevê a perda de “ações fantasmas” (unidades monetárias de incentivo) pelo empregado que pedir demissão antes de decorrido o prazo de carência (“vesting”)” (ARR-2843-80.2011.5.02.0030, Relatora Ministra: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, da 8ª Turma, publicado: DEJT 20/11/2015). Ou seja, o TST reconheceu que a cláusula de previa o direito a “ações fantasmas” possuía natureza mercantil e não trabalhista.
Em outras palavras, a jurisprudência trabalhista brasileira está reconhecendo que os contratos de trabalho dos altos executivos podem possuir:
i) parcelas de natureza trabalhista e remuneratória (ex: salário-base, 13º salário);
ii) parcelas de natureza trabalhista e não remuneratória (verbas indenizatórias). (ex.: ajudas de custo, prêmio etc.) e
iii) parcelas de natureza mercantilista – não trabalhista, mas conexas ao contrato de emprego – (são vantagens não trabalhistas, ou seja, parcelas não insertas na legislação do trabalho, mas que decorrem do contrato de emprego. (ex.:stock options, phantom options e as ISU).
Ocorre que a reforma trabalhista trouxe uma nova modalidade de contrato de altos cargos (conhecida como dos hiperssuficientes), prevista no parágrafo único, do artigo 444, da CLT. Ela exige que o diretor a ser contratado preencha 2 requisitos:
i) diploma de nível superior e
ii) perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.
A ideia do legislador foi delegar a esses empregados hiperssuficientes (CLTs) a liberdade de contratação de alguns componentes do contrato de trabalho exemplificativamente eleitos no artigo 611-A, da CLT.
A negociação efetivada entre o hipersuficiente e o empregador é válida, eficaz e dá segurança às partes por ter força semelhante ao de um Acordo Coletivo, desde que, obviamente, não contradiga a Constituição Federal, a CLT e as normas específicas.
Nesse sentido, o movimento que tem sido verificado no mercado é que as empresas estão optando por celebrar contratos de “altos salários” com esses altos executivos, passando a tratá-los como hiperssuficientes e aproveitando para discriminar a natureza de todas as parcelas trabalhistas e mercantis que serão praticadas entre as partes, incluindo as cláusulas de Clawback Clauses, com muito mais segurança jurídica. No futuro, se necessário o estorno de algum valor pelo alto executivo, repita-se somente nas hipóteses acima mencionadas, poderá fazê-lo em harmonia com as regras de compliance da empresa.
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¹ Advogado. Mestre em Direito das Relações Sociais com ênfase em Direito do Trabalho Coletivo e Individual pela PUC-SP. Especialista em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho pelo COGEAE — PUC- SP.